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Artigo: Inovação ou eficiência? Você deve escolher ambas

Por: Gilmar Bezerra e Jésus Gomes  Artigo publicado originalmente na Finanças FECAP: Revista...
Imprensa | 01/07/2021
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Por: Gilmar Bezerra e Jésus Gomes 

Artigo publicado originalmente na Finanças FECAP: Revista do Instituto de Finanças FECAP, produzida semestralmente pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP).

Poucas empresas que começaram o novo milênio entre as líderes de seus respectivos setores ainda permanecem com suas posições inabaladas. No início dos anos 2000, o Yahoo era o maior portal de internet do planeta, chegando a valer mais de US$45 bilhões, e a Blackberry era o sonho de consumo de todo mauricinho, detendo mais da metade do mercado de celulares nos Estados Unidos. Quem se lembra da Atari? E quanto à MySpace, a primeira grande rede social do mundo? Não podemos esquecer a Xerox, sinônimo de cópias no Brasil. Que tal a Blockbuster, que dominou o mercado de locação de filmes? Ou, antes, a Kodak, que, ao final do Século XX, detinha quase 80% do mercado mundial de produtos para fotografias? Ambas desapareceram, respectivamente, em 2010 e 2012. 

O que levou essas empresas tão rapidamente da liderança em seus respectivos mercados ao fracasso retumbante? Clayton Christensem (2013), provavelmente, daria uma resposta curta e direta: elas fracassaram porque fizeram tudo ‘certinho’. Essas empresas contrataram ou promoveram executivos sérios e competentes, egressos das melhores escolas de negócios do mundo; elas criaram estratégias para prestar cuidadosa atenção aos seus clientes e investiram vultosas somas de dinheiro em pesquisa e desenvolvimento, melhorando continuamente os seus produtos e processos na perspectiva dos seus clientes mais exigentes. 

Mas elas foram incapazes de levantar os faróis, olhar em volta e entender os sinais do mercado sobre o que viria em seguida. Com estruturas burocráticas, caras e lentas, guiadas por processos de benchmarking e viciadas em elevadas margens de retornos, elas ficaram congeladas em suas culturas e não puderam se reinventar para criar os mercados do futuro. Concorrentes novos e não convencionais emergiram, sobretudo no low-end market, onde as inovações mais devastadoras costumam surgir. 

Pensem na maneira como se toma um táxi hoje e há dez anos; em como você ouve música, lê notícias, ‘vai’ ao supermercado, compra livros ou usa GPS no seu automóvel. 

E quanto ao futuro da sua empresa? Qual tem sido o seu comportamento? Você se parece mais com um engenheiro de manutenção, atuando para fazer cada vez mais do mesmo, ou se sente como um artesão, criando os mercados do futuro? 

Na literatura de negócios, ainda é predominante a acomodada abordagem baseada no trade-off entre inovação e eficiência. Assim, entende-se que as organizações precisam escolher entre ser eficientes, buscando ganhos de escala, ou inovadoras, investindo na criação de novos produtos, processos, estratégias e mercados. Entretanto, em um mundo VUCA (acrônimo que descreve um ambiente de volatilidades, incertezas, complexidades e ambiguidades) você não pode mais escolher uma das duas. 

Em uma pesquisa que conduzimos no Mestrado Profissional da FECAP, descobrimos o segredo por trás das organizações ambidestras. São organizações que asseguram prosperidade e sobrevivência de longo prazo, construindo um desempenho de excelência em ambas as dimensões, eficiência operacional (exploitation) e criação dos mercados do futuro (exploration). 

Embora tenha sido apresentado por Duncan em 1976 (dual structures), foi nas últimas duas décadas que o termo ambidestria ganhou destaque e relevância na literatura de negócios, com os estudos de Tushman e O’Reilly III (1996), Raisch e Birkinshaw (2008), Gibson e Birkinshaw (2004), analisando empresas como, por exemplo, IBM, Nestlé, GlaxoSmithKline, BMW Group e Alphabet/Google. Todas essas organizações apresentaram características ambidestras em suas estratégias e em suas estruturas, contribuindo decisivamente para que permanecessem competitivas em seus respectivos mercados ao longo de décadas. Agora, identificamos os fundamentos dessa abordagem em uma tradicional organização brasileira do segmento de produtos financeiros. Compartilhamos neste artigo uma síntese das nossas descobertas: 

1) Dilema entre ser eficiente e ser inovador: de um lado, a cobrança por resultados imediatos pressiona os gestores a realizarem escolhas (trade-off) e alocarem recursos em ações de curto prazo. Afinal, é a receita de curto prazo que paga as contas. De outro lado, a competitividade, a inovação tecnológica e as rápidas mudanças de um mercado hostil e de altos níveis de incertezas forçam que as organizações invistam recursos significativos em projetos para diversificar produtos e serviços. Afinal de contas, é necessário se manter no mercado e o passado que o trouxe até aqui pode não ser suficiente para o manter competitivo no futuro. 

2) Ambidestria Organizacional: abordagem que se propõe a tirar proveito de ambas as dimensões. Pode ser compreendida como a capacidade da organização em ajustar a sua estratégia, estrutura e processos para buscar, simultaneamente, ações e atividades de curto prazo voltadas à eficiência operacional (exploitation) e estratégias com foco em inovação (exploration), voltadas para o longo prazo, como pesquisas e desenvolvimentos de produtos, serviços, processos e novos mercados. 

Como promover a ambidestria? Diferentes tipologias foram propostas para lidar com a dualidade entre exploitation e exploration. Dentre as principais tipologias, destacam-se: a) Ambidestria Contextual, com predominância de uma cultura inovadora por toda organização; b) Ambidestria Sequencial, obtida através de um processo sequencial de ações, atividades e iniciativas; c) Ambidestria Estrutural, prevalecendo estruturas dedicadas para cada dimensão. No quadro a seguir detalhamos as características de cada modelo: 

Adaptado de Chen 2017), p. 339; Tushman, O’Reilly III e Charles. (1996), p. 8-29. 

Como implementar a ambidestria organizacional? Apesar dos avanços na pesquisa sobre a viabilidade e a necessidade da adoção de uma abordagem estratégica baseada no conceito de ambidestria, a sua implementação tem-se mostrado um desafio que não se limita à dualidade entre os processos de exploitation e exploration. 

Nossas evidências foram produzidas por intermédio de uma pesquisa em profundidade realizada em um centenário grupo brasileiro de grande porte, provedor de serviços de infraestrutura e soluções tecnológicas para o mercado financeiro e de capitais. A organização é o resultado de um contínuo processo de fusões e aquisições. Embora inserida em um setor de forte concorrência e extremamente rígido, com regulações externas, governamentais e de outras partes interessadas, a empresa superou as limitações da rígida burocracia brasileira, mantendo a excelência operacional e desenvolvendo produtos e serviços inovadores para o mercado financeiro. 

Nossa pesquisa identificou que o desenvolvimento dessa organização ambidestra foi um processo (e não um evento) que se consolidou ao longo de quatro anos, percorrendo quatro etapas, distintas e complementares, conforme apresentamos no diagrama a seguir e descrevemos objetivamente na sequência: 

Ações diretivas e deliberadas por intermédio da realização de um planejamento estratégico estruturado, avaliando o cenário de competitividade e o desenvolvimento de novas tecnologias. O objetivo é induzir a formação da ambidestria estrutural através das diferentes áreas da organização, por meio da exploração de tecnologias disruptivas, avaliação de parcerias e aquisições potenciais, processos, pesquisas, multiplicação de conhecimento e proximidade com clientes e reguladores. 

Convergência/transição para produção, para evitar que iniciativas viáveis que emergem de grupos multidisciplinares de pesquisas (exploration), após validadas com clientes internos, externos e reguladores, sejam bloqueadas no processo de transição do laboratório de inovação para as unidades de implantação e produção (exploitation), caracterizando, desse modo, a ambidestria sequencial. 

Processo de aprendizado e descentralização. Embora as iniciativas que culminaram na ambidestria estrutural e ambidestria sequencial, tivessem apresentado ótimos resultados na criação de novos produtos, novos serviços e otimização de processos, foi identificada a necessidade de descentralizar as iniciativas, disseminando a cultura ambidestra para todas as áreas e buscando a promoção da inovação em todos os processos da organização. 

Difusão da cultura de inovação. A organização trabalha atualmente para consolidar a ambidestria contextual, com iniciativas que buscam incutir a cultura de inovação em todos os colaboradores, encorajando a autonomia na busca por inovação, seja em produtos ou ganhos de eficiência. 

Dois fatores se mostraram relevantes para a constituição de um ambiente contemplando as três tipologias ambidestras na organização: o primeiro deles diz respeito aos processos instituídos, que permitem proximidade com os clientes e reguladores, gerenciando conflitos e alinhamentos de interesses; o segundo se refere ao papel da liderança da organização, cujo engajamento efetivo se mostrou decisivo. Ambos foram fundamentais para criar a organização ambidestra, superando a dicotomia eficiência-inovação e fazendo convergir qualidade total e inovação total. Todos cuidam da qualidade dos produtos (exploitation) e todos buscam a inovação (exploration). 

Referências  

Chen, Y. (2017). Dynamic ambidexterity: How innovators manage exploration and exploitation. Business Horizons60(3), 385–394. https://doi.org/10.1016/j.bushor.2017.01.001 

Christensen, C. M. (2013). The innovator’s dilemma: when new technologies cause great firms to fail. Harvard Business Review Press. 

Gibson, C. B., & Birkinshaw, J. (2004). The antecedents, consequences, and mediating role of organizational ambidexterity. Academy of Management Journal47(2), 209–226. 

Raisch, S., & Birkinshaw, J. (2008). Organizational ambidexterity: Antecedents, outcomes, and moderators. Journal of Management34(3), 375–409. https://doi.org/10.1177/0149206308316058 

Tushman, M. L., & O’Reilly III, C. A. (1996). Ambidextrous organizations: Managing evolutionary and revolutionary change. California Management Review38(4), 8–29. 

Sobre os autores 

Gilmar Bezerra

Mestre em Administração pelo Centro Universitário da Fundação Escola de Comercio Alvares Penteado (FECAP). É especialista em Liderança e Gestão pela Saint Paul Escola de Negócios.  

[email protected] 

Jésus de Lisboa Gomes  

Mestre em Administração pelo Centro Universitário FECAP e Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É consultor de empresas em gestão da mudança. 

[email protected] 

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