As empresas brasileiras estão enfrentando um novo desafio silencioso no mundo corporativo: o quiet cracking. O termo refere-se ao fenômeno em que o colaborador continua presente em seu posto de trabalho, mas sua envolvência emocional, mental e afetiva vai se esvaindo.
É um processo invisível de desengajamento emocional e mental, em que o empregado perde motivação, sentido e pertencimento ao longo do tempo. O resultado é uma queda sutil no entusiasmo, na produtividade e na participação ativa nas dinâmicas corporativas.
Segundo o professor Marcelo Treff, especialista em gestão de carreira da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), “o quiet cracking é como uma rachadura interna: o profissional está presente, cumpre suas tarefas, mas já não ressoa com sua própria presença no ambiente de trabalho. É um distanciamento que corrói a conexão com o propósito e afeta desempenho e bem-estar.”
Alguns fatores favorecem o surgimento do chamado “quiet cracking”. Entre eles estão a insegurança no emprego, a falta de perspectivas de crescimento e os receios relacionados à automação e ao avanço da inteligência artificial. Soma-se a isso a ausência de uma comunicação eficaz e conectada entre líderes e colaboradores — quase metade dos profissionais afirma que suas preocupações não são ouvidas — e também a sobrecarga de trabalho em ambientes que não oferecem reconhecimento ou que estabelecem metas descoladas da realidade, o que intensifica o desgaste emocional.
As consequências desse fenômeno são significativas tanto para as pessoas quanto para as organizações. No plano individual, há um desgaste psicológico evidente: trabalhadores que não se sentem reconhecidos ou conectados desenvolvem ansiedade, frustração e ficam mais propensos ao burnout, mesmo que não deixem imediatamente seus cargos.
Já para as empresas, a produtividade é prejudicada de maneira invisível, pois a presença do colaborador se torna mecânica e o entusiasmo, a criatividade e a colaboração desaparecem. Esse cenário ainda impacta o ambiente de trabalho, deteriorando o clima organizacional, enfraquecendo a cultura e eliminando o senso de pertencimento. Além disso, surgem custos ocultos expressivos, refletidos em aumento do turnover, absenteísmo e queda de performance, o que afeta diretamente as finanças e a imagem institucional.
Identificar o “quiet cracking” é um desafio, justamente pela sua sutileza. “O colaborador pode continuar entregando resultados básicos, mas tende a participar menos das reuniões, afastar-se de iniciativas sociais ou informais da equipe e apresentar sinais de fadiga contínua ou mudanças de humor”, explica Treff.
Para o professor da FECAP, algumas práticas podem ajudar líderes a prevenir ou interromper esse processo de desgaste silencioso. Ele ressalta a importância de cultivar o diálogo aliado à empatia ativa, realizando conversas individuais genuínas e oferecendo apoio real. Também é essencial manter o reconhecimento contínuo, valorizando conquistas e esforços de forma visível e regular, além de investir no desenvolvimento por meio de treinamentos, mentorias e oportunidades de aprendizado voltadas ao futuro do trabalho.
Outro ponto destacado é a necessidade de comunicação clara e de um propósito compartilhado, para alinhar expectativas e conectar colaboradores à missão da organização. Por fim, cuidar da sobrecarga emocional é fundamental, com políticas que favoreçam o equilíbrio entre vida pessoal e profissional e promovam atenção à saúde mental.
O especialista: Marcelo Treff é professor de Gestão de Pessoas da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP). Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP e Mestre em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atua com os seguintes temas: Gestão da Carreira, Gestão de Competências, Gestão de Pessoas e Comportamento Organizacional.