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O que esperar da reforma tributária?

O sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos no mundo, e uma reforma tributária deve...
Imprensa | 20/04/2023
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O sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos no mundo, e uma reforma tributária deve ser posta à mesa pelo governo federal em breve. Mas a pauta já está em discussão no Brasil há algum tempo, segundo o professor de Contabilidade da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) Tiago Slavov

“O aperfeiçoamento de sistemas tributários é algo muito comum e frequente em todos os países. O Brasil, no entanto, é uma exceção para o mal: as mudanças são diárias, mas na sua quase totalidade, burocratizam ainda mais o sistema. Por isso o país sempre figurou como um dos piores do mundo no estudo Paying Taxes do Banco Mundial, estudo que analisa o sistema tributário de 189 nações (ficou em 184º no ano de 2020)”, explica o docente. 

DISCUSSÃO HÁ PELO MENOS VINTE ANOS 

As discussões para o aperfeiçoamento do sistema tributário no Brasil tramitam desde a organização política-administrativa do Brasil estabelecida na Proclamação da República em 1891, que definiu o modelo de federação (governo federal, estados e municípios). Alguns “marcos históricos” da reforma ocorreram na década de 1960 (criação do ICM), em 1988 (Constituição Federal) e em 2003 (primeiro governo Lula). 

Segundo Slavov, a “reforma” de 2003 pretendia promover mudanças relevantes no ICMS, mas ficou restrita a ajustes fiscais como a desvinculação de receitas tributarias e a prorrogação da CPMF (extinta em 2007). Muitas das “pendências” da reforma de 2003 (como incentivos fiscais, alíquotas, simplificação) são o foco da reforma atual. “Ou seja, o problema atual já tem, pelo menos, 20 anos de discussão sem avanços significativos”, acrescenta. 

O QUE ESPERAR DA REFORMA 

Na opinião do professor universitário, é necessário reforçar que a demanda por “reformas tributárias” alcança muitos tributos, sendo os principais os tributos sobre o consumo (ICMS, IPI, PIS, COFINS, ISS), sobre a renda (IRPJ e CSLL), sobre o trabalho (INSS, IRPF e FGTS) e sobre o patrimônio (IPVA, IPTU, ITCMD e ITBI). 

No momento, a ênfase do governo é a proposta de reforma dos tributos sobre o consumo, sendo que as propostas em discussão estão documentadas nas PECs 45/2019 e 110/2019. Dentre as propostas em discussão, a melhor proposta é a da PEC 45, que alcança cinco tributos:  IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS. A PEC 110 é mais abrangente, alcançando o IOF, CIDE-Combustíveis e Salário-Educação. Em ambas as propostas, contudo, não se discute redução de carga tributária, que é uma das mais altas entre os países emergentes. 

“O Governo Bolsonaro chegou a apresentar o Projeto de Lei 3887/20, com diretrizes diferentes das PECs já mencionadas (ênfase nos tributos PIS e COFINS), mas o projeto não avançou. O atual governo, no entanto, está trabalhando em uma reforma que equilibra disposições de ambas as PECs”, lembra. 

EXEMPLOS DO EXTERIOR 

Os efeitos das reformas tributárias em outros países refletem muito mais o cenário político e econômico do país do que as mudanças tributárias em si. A comparação com a realidade brasileira, considerando as particularidades sociais é muito difícil. 

Um exemplo de modelo tributário positivo, é o neozelandês, adotado em 1986 e um dos principais responsáveis, segundo estudos, pelo crescimento econômico do país.  Neste modelo, todos os produtos e serviços são tributados, basicamente, por duas alíquotas: 0% para os “essencialíssimos” e 15% para os demais. O modelo é não cumulativo na sua totalidade (tudo o que se compra gera “crédito” tributário). 

O principal “entrave” para a adoção do modelo neozelandês no Brasil é, também, o principal entrave para a reforma do nosso sistema atual: o sistema político-orçamentário no país, que determina como ocorre a arrecadação tributária dos governos Federal, Estaduais e Municipais. 

“O Governo Federal é responsável pela arrecadação de 2/3 dos tributos no país, concentrando o poder de distribuir esses recursos, em grande parte, conforme a vontade política dos governantes. A descentralização dos recursos, neste sentido, é uma demanda de Governadores e Prefeitos. Mas o Governo Federal nunca sinalizou querer largar o osso”, avalia 

Neste sentido, um exemplo negativo de reforma tributária é o modelo adotado na Índia em 2017, que tentou adaptar o modelo neozelandês, mas que depois de muitas discussões e “tratativas políticas”, reduziu significativamente o alcance da “simplificação”, excetuando diversos produtos de uma alíquota padronizada e admitindo tributos de competência estaduais e distritais. Ou seja, o sistema tributário permaneceu complexo, embora a reforma introduziu melhoras importantes. 

Ainda utilizando o exemplo da reforma tributária adotada pela Índia em 2017, apesar de não alcançar a simplificação pretendida originalmente, as mudanças em direção ao modelo harmonizado de tributação sobre bens e serviços, combinadas com mudanças no sistema de repartição da arrecadação entre o governo central e estaduais naquele país, permitiu tornar os produtos e serviços mais competitivos dentro do país e favoreceu as exportações. 

Como resultado, os estudos observaram um acréscimo de 2% no PIB indiano nos anos seguintes em decorrência da reforma tributária, que proporcionou uma melhora no ambiente de negócios, com empregadores contratando mais e pagando maiores salários pela redução do custo com a “burocracia tributária”, o que por sua vez melhorou o bem-estar da população.  

“Ou seja, utilizando o exemplo da Índia e de vários outros países emergentes como o Brasil que adotaram reformas tributárias na tributação sobre o consumo, observa-se que a simplificação do sistema tributário brasileiro pode impactar o emprego e o crescimento do país”, frisa Slavov. 

Contudo, para reduzir a desigualdade social, é necessário que outras reformas avancem, especialmente aquelas que “miram” a regressividade tributária (pessoas mais pobres atualmente pagam mais impostos, proporcionalmente, que os mais ricos). Para essa mudança, contudo, será necessário mudar a carga tributária dos tributos sobre o consumo (algo que não está em discussão hoje), aumentando a tributação sobre a renda e patrimônio, por exemplo.  

“Considerando o cenário de caos tributário que vive o Brasil, qualquer melhoria em direção à simplificação tributária já é algo a se comemorar muito. Contudo, mesmo sendo prioridade do atual governo, muitos sinais indicam que a insistência em modelo ideal pode inviabilizar o modelo viável. É melhor priorizar, neste momento, o viável. Depois avançamos para o ideal. Ou como já disse Voltaire: o ótimo é inimigo do bom”, finaliza o professor da FECAP. 

O especialista: Tiago Nascimento Borges Slavov é doutor em Contabilidade pela USP e Mestre em Contabilidade pela FECAP. É professor do Programa de Mestrado em Ciências Contábeis da FECAP e coordenador do Núcleo de Apoio Fiscal e Contábil (NAF) da FECAP. 

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